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Vanessa Murussi Bordoni

A OPINIÃO QUE GRITA MAIS ALTO: UMA ANÁLISE SOBRE O COMPORTAMENTO DA OPINIÃO PÚBLICA

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Por:

*Vanessa Murussi Bordoni


Quando você ouve falar em opinião pública tem a impressão de que ela seria democrática e representaria os interesses da maioria? Então te convido para seguir essa leitura, pois o assunto é mais complexo do que isso.


A opinião pública não tem a capacidade de representar a maioria de uma população ou público-alvo, mas ela acaba sendo a representação das opiniões individuais, ou de um grupo, que se manifestam mais ou com maior poder de cativar seguidores. Sendo assim, a opinião que 'grita mais alto' é a que acaba por representar o todo.


Neste trecho de HIWATASHI, retirado do livro Públicos, Opinião dos Públicos e Opinião Pública (2017, p.40), podemos pensar um pouco sobre isso:


Consideramos que a Opinião Pública não exista sob a forma de algo único, maior, hegemônico ou que paire sobre a maioria das pessoas: independentemente do processo de filtro e da ideologia tanto do emissor como do interagente, tendemos a crer que a opinião seria uma construção individual. Ela ocorre em diferentes contextos e em diferentes graus a partir da interpretação que cada pessoa faz sobre a informação recebida.


Atualmente, com o crescimento no uso das redes sociais, fica mais evidente a diversidade de opiniões existentes, o que dificulta a intenção de catalogar tais opiniões e chegar a um número, sendo que muitas vezes existe grande subjetividade que impede de somar as opiniões individuais para chegar em um resultado coletivo. O que acontece então é que as opiniões que mais se propagam, seja por alcance, seja por poder de influência do seu emissor, acabam sendo tidas como a opinião da maioria do público.


Essa característica da opinião pública, pode esconder um perigo para a harmonia social e para a democracia, quando existem interesses individuais, e por vezes escusos, por trás da propagação dessas ‘opiniões’. Mesmo não representando a maior parcela de um grupo, o posicionamento individual tem a tendência de ganhar adeptos e ser replicado.


Segundo o professor Clóvis de Barros Filho, a formação da opinião está relacionada com a identificação ou não, das pessoas, com os fatos analisados. Dessa forma, a opinião está mais baseada na emoção do que na análise racional, fator que reforça a sensação de maioria, quando falamos em opinião pública.


Essa conclusão acima, ficou clara quando, em um trabalho da faculdade, realizamos uma pesquisa sobre a Samarco. No trabalho em questão, pude averiguar que as palavras que as pessoas utilizaram, para se referir ao caso do acidente de graves consequências ambientais em Minas Gerais, foram termos altamente utilizados em reportagens e comentários nas redes sociais, como: tragédia, impunidade, descaso, 'mar de lama', enfim. Isso leva a entender que uma grande parcela das pessoas não forma uma opinião própria, baseada em análise de diversas fontes de informação, mas sim, aceita ou refuta uma opinião já formada, através de uma identificação pessoal com o assunto ou o emissor.


Essa efervescência do emocional, agrega a opinião individual a facilidade de condução, bem como a torna extremamente volátil, podendo ganhar grande proporção em determinado momento e também mudar com facilidade, em outro. Não devendo ser desconsiderado o poder de influência que permeia a opinião pública, mais um fator que retira dela a característica de ser democrática.


Nesse contexto, as pesquisas aparecem como uma ferramenta que busca enquadrar as opiniões individuais em pautas preexistentes, para poder somar os resultados e encontrar uma maioria manifesta. Como é impossível entrevistar a todos os membros de uma população, retiram-se amostras e depois aplica-se os resultados obtidos à população. O resultado da pesquisa, então, será o posicionamento dos que se manifestaram, e não, de fato, a opinião da maioria da população afetada pelas decisões ou posicionamentos decorrentes dessa pesquisa.


Pierre Bourdieu levanta três pontos importantes sobre as pesquisas, no artigo **A opinião pública não existe, os quais transcrevo abaixo:

- Primeiramente, toda pesquisa de opinião supõe que todo mundo pode ter uma opinião; ou, em outras palavras, que a produção de uma opinião está ao alcance de todos. Correndo o risco de ferir um sentimento ingenuamente democrático, contestarei este primeiro postulado.

- Segundo postulado: supõe-se que todas as opiniões se equivalem: penso ser possível demonstrar que isto é absolutamente falso e que o fato de acumular opiniões que não têm absolutamente a mesma força real leva a uma distorção muito profunda.

- Terceiro postulado implícito: no simples fato de fazer a mesma pergunta para todo mundo acha-se implícita a hipótese de que existe um consenso sobre os problemas, em outras palavras, de que existe um acordo sobre as perguntas que merecem ser feitas.


Em diferentes esferas da sociedade, sejam órgãos públicos, empresas ou associações, mesmo quando existe o interesse de representar a maioria do grupo envolvido, mesmo tentando pautar as decisões baseados em uma visão coletiva e não individual, é muito difícil encontrar o consenso, principalmente pela ausência da manifestação das opiniões individuais.

Lamento perceber que estamos longe de sermos cidadãos coerentes e colaborativos. Por vezes, evitamos de nos posicionar e participar, quando nossa opinião será útil na tomada de decisões. Mas conseguimos ser extremamente cruéis no momento de criticar e julgar aqueles que agem. Por vezes, nossa opinião é incoerente quando a expressamos de uma forma, mas nossas atitudes e ações andam no sentido oposto ao que foi proferido.


Talvez um bom caminho para promover a harmonia social, seria se, cada um de nós deixasse de procurar adeptos do nosso modo de pensar e apenas aceitasse as opiniões divergentes. Afinal, a vida não é um jogo de cabo de guerra, em que precisamos escolher um lado e defendê-lo com unhas e dentes. A vida se aproxima mais de uma construção coletiva, em que cada um faz a diferença no resultado obtido, assim como cada um será impactado por ele.


Fica a reflexão final: será que emitimos nossa opinião com o intuito de colaboração e transformação das realidades que nos desagradam? Ou será que encontramos na crítica uma forma de desabafo, uma forma de amenizar nossas próprias falhas e fraquezas?


A opinião, seja ela individual ou pública, pode ser construtiva, mas também pode ser extremamente destrutiva. Qual delas é a opinião que grita mais alto?




* Vanessa Murussi Bordoni - graduanda em Relações Públicas pela Unisinos. Produtora de conteúdo com certificação em Copywriting.






Referências:

HIWATASHI, Erica (Org.) - Públicos, opinião dos públicos e opinião pública; Editora Unisinos 2017;

BOURDIEU, Pierre – A opinião pública não existe - In: THIOLLENT, Michel. Crítica Metodológica, investigação social e enquete operária. São Paulo: Polis, 1981. p. 137-151

Vídeo: A Opinião Pública como você nunca viu | Prof. Clóvis de Barros Filho; https://www.youtube.com/watch?v=TgBv9kqVpu8&feature=youtu.be; Acesso em maio/2016.

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